“Como vai
você?”. Vez ou outra me pego pensando em como sugamos o sentido que trazem
essas palavras – ou trariam – e injetamos valor de cumprimento. Não valendo
muito mais que um “oi” ou um “boa tarde”. Talvez um dia realmente existisse a
preocupação à primeira vista, ou pelo menos à segunda ou terceira. Mas, hoje,
deve ser seguida – sem ressalvas de verdades – de um “vou bem e você?”.
Habituamo-nos
a vestir máscaras, é estranho até pensar nisso, na ausência delas. É estranho
se abrir, desabrochar, chorar. Melancolias podem não ser bem vistas por
espíritos alegres. Guardamos isso para os quartos, banheiros, olhares próximos
que sabemos que vão ficar após a primeira lágrima. Não contamos a um estranho
no banco do parque o quão difícil pode ser a vida, preferimos comentar o tempo.
Aliás, o tempo é a entrada ou saída – ou nenhuma das duas – mais confortável
para encontros assim, às cegas. Pois afinal, o que se enxerga através de um
"que calor"?
Esconder-nos
não é tão difícil. Vivemos em um incansável jogo de esconde-esconde, ou, para
ser mais artística a existência, em uma interminável peça teatral. Engraçado é
que, ao imaginar nossas vidas em um palco consideramos impossível, à beira do
fantástico, o cúmulo da vivência ou, até mesmo, uma fatídica prisão.
Por falar em
prisão, caminhemos nessas palavras pelos opostos. Pensemos então, na liberdade.
Já me vi diversas vezes refletindo a respeito dessa palavra, até a mesma se
tornar um simples jogo de sílabas. “Liberdade como?” “Liberdade de quê?”. Por
um lado, escolhemos essa prisão. Talvez para afastar possíveis curiosos com
discursos cortantes e conclusões vazias de quaisquer que sejam nossos problemas.
Por outro, escolhemo-la pela dificuldade que há em atravessar as grades, apenas
desistindo de tentar o que está além de nossas capacidades ou o que nossas
cicatrizes estão cansadas de nos relembrar: a tortura que é a crença seguida da
decepção.
E não
escrevo aqui para culpar o mundo, as crenças, as pessoas, o tempo ou a
existência. A culpa não resolve nada, é um sentimento amargo demais para se
tornar solução. Escrevo aqui pelas possibilidades. Principalmente aquelas
que permitem - e direcionam - as mudanças. Escrevo pela compreensão, o sinônimo mais humano de liberdade. Escrevo aos ombros dispostos a
receber as dores alheias sem orgulho ou qualquer julgamento, aos olhos prontos para perceber um
pedido silencioso de ajuda.
Escrevo
àqueles dispostos a romper as grades. Os blocos concretos e virtuais que
nos separam como seres humanos, como seres. Transbordando uma individualidade
que, simplesmente, não nos supre. E nós sabemos disso. Escrevo para perguntar,
sem cordialidades de cumprimento, sem ressalvas de sentimento: Como vai você?
Texto e Ilustração por Giulia Britto.